A crise ambiental global tem origem em nosso modelo de desenvolvimento e tornou-se mais explícita ao longo das últimas décadas. Suas causas são diversas, mas o maior desafio é o das mudanças climáticas causadas, sobretudo, pelo acúmulo excessivo de gases de efeito estufa (GEEs) resultantes da queima de combustíveis fósseis, como carvão, petróleo e gás natural. As principais atividades responsáveis por essas emissões incluem transporte, indústria e construção civil, além de agricultura em larga escala e desmatamento. Entenda o elo entre Crise Ambiental Global, Consumo Energético e Geração de Resíduos e as consequências para o desenvolvimento sustentável.
Segundo o cenário pessimista descrito pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) para os próximos 100 anos (1), as projeções sobre os impactos das mudanças climáticas indicam perda da biodiversidade, queda na produção agrícola, deslocamento de populações, aumento do nível do mar e intensificação de eventos extremos, para citar apenas alguns. Estudos econômicos demonstram que fazer nada custará mais caro do que agir imediatamente para reduzir as emissões de GEEs.(2)
A construção civil responde por cerca de 40% do consumo de energia no mundo, 30% dos resíduos gerados e até 30% das emissões de GEEs de energia (3). O Green Building Council da Argentina (4) aponta que os edifícios respondem mundialmente por 25% do uso da madeira. O setor é responsável ainda por cerca de 12% do consumo da água potável, um percentual significativo, se considerarmos que apenas 0,77% de toda água no planeta é apropriada para consumo humano. Um estudo brasileiro estima que a perda de materiais em processos construtivos convencionais seja de 27% em média, entre os materiais estudados. (5)
De acordo com o Banco Mundial, 37% da eletricidade gerada na América Latina provém da queima de combustíveis fósseis. Além de serem os grandes vilões do aquecimento global e da poluição do ar, esses elementos da matriz de energia acarretam riscos de instabilidade e insegurança energética, devido às variações bruscas de preço que historicamente acompanham os derivados de petróleo no mercado internacional.
Mesmo a maior fonte de energia elétrica do continente, a hidroeletricidade, apesar de ser considerada renovável e limpa do ponto de vista das emissões de carbono, gera inúmeros impactos ambientais e altos custos econômicos e sociais para sua expansão, principalmente ligados à alteração do entorno das usinas, deslocamento das populações ribeirinhas e diminuição do volume dos rios.
Do ponto de vista de desenvolvimento econômico, a insegurança energética e a matriz não diversificada representam importantes gargalos ao crescimento dos países sul-americanos e resultam, inclusive, em tensões diplomáticas.
As edificações são responsáveis por 60% do consumo global de eletricidade, de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Avalia-se que o consumo energético deverá dobrar até 2030 (6) e que cerca de US$2.5 bi poderiam ser economizados através de medidas de eficiência energética a cada ano.
No caso do Brasil, estima-se que as edificações consumam algo em torno de 42% do total da energia, conforme números divulgados pela Empresa de Pesquisa Energética – EPE.

Em relação ao uso de madeira, o quadro tampouco é alentador. O desmatamento de florestas tropicais responde por cerca de 20% das emissões globais e mais de 60% das emissões brasileiras. No Brasil, o desmatamento geralmente se inicia com a exploração ilegal da madeira, embora outros fatores contribuam fortemente, como a agropecuária e a agricultura. As estimativas indicam que entre 43% e 80% da produção madeireira da região amazônica seja ilegal (7). Um estudo do IMAZON revela que, em 2009, aproximadamente 79% do volume de madeira produzido na Amazônia foi destinado ao mercado brasileiro, do qual 17% ao Estado de São Paulo e 15% à Região Sul. (8)
Além do elevado consumo de recursos naturais, outro grande problema ligado à construção civil é a geração dos resíduos da construção e demolição (RCD), que normalmente representam metade da massa de resíduos sólidos urbanos. Em São Paulo, calcula-se que cerca de 17 mil toneladas de entulho sejam geradas todos os dias. Além da destinação inadequada, bastante comum na região, governos arcam ainda com os problemas de saúde pública resultantes da destinação inadequada dos resíduos e com problemas para a infraestrutura urbana, como o agravamento das enchentes. Os custos estimados com disposição inadequada dos resíduos inertes variam entre US$5,4/ton e US$14,8/ton de RCD recolhido, dependendo da cidade e das técnicas de recolhimento. (9)
Fonte: Construindo Cidades Verdes: Manual de Políticas Públicas para Construções Sustentáveis. Organizadores: Laura Valente de Macedo; Paula Gabriela Freitas. 1ª ed. São Paulo, 2011 – ICLEI – Brasil
Referências:
- 5 IPCC. Quarto Relatório (AR4) do Grupo de Trabalho I (WGI), lançado em 2007.
- 6 STERN, Nicholas. The Stern Review on the Economic Effects of Climate Change, 2006. Disponível em http://webarchive.nationalarchives.gov.uk/+/http://www.hm-treasury.gov.uk/stern_review_report.htm Acesso em 3 de março 2011.
- 7 Levine, M., D. Ürge-Vorsatz, K. Blok, L. Geng, D. Harvey, S. Lang, G. Levermore, A. Mongameli Mehlwana, S. Mirasgedis, A. Novikova, J. Rilling, H. Yoshino, 2007: Residential and commercial buildings. In Climate Change 2007: Mitigation. Contribution of Working Group III to the Fourth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change [B. Metz, O.R. Davidson, P.R. Bosch, R. Dave, L.A. Meyer (eds)], Cambridge University Press, Cambridge, United Kingdom and New York, NY, USA.
- 8 Capítulo argentino da organização internacional WGBC, cuja missão é promover construções sustentáveis. Também conhecida por ser a certificadora do sistema LEED, com origem nos EUA.
- 9 FINEP, ITQC. Alternativas para a redução do desperdício de materiais nos canteiros de obras. Disponível em perdas.pcc.usp.br . Acesso em 4 de fevereiro de 2011.
- 10 World Green Building Council. Six Continents, One Mission, Novembro 2009. Disponível em: www.worldgbc.org/images/stories/pdf/gbc%20report%20final_low%20res.pdf
- 11 ZENID, G. J. (Coord). Madeira : uso sustentável na construção civil. 2. ed., São Paulo : Instituto de Pesquisas Tecnológicas: SVMA, 2009.
- 12 A atividade madeireira na Amazônia brasileira: produção, receita e mercados, Serviço Florestal Brasileiro & Imazon. 2010 disponível em http://www.imazon.org.br/novo2008/publicacoes_ler.php?idpub=3709, acessado em 2 de março de 2011
- 13 Pinto, Tarcísio de Paula. Metodologia para a gestão diferenciada de resíduos sólidos da construção urbana. São Paulo, 1999.