A gestão de resíduos e tratamento de efluentes tem sido por muitas décadas um grande desafio de diversos setores produtivos, e ênfase nesse tema vem sendo dada na busca de soluções que envolvam adequação de efluentes líquidos aos padrões de qualidade aceitáveis e um tratamento de resíduos que garanta o menor impacto ambiental possível. A combinação entre resíduos sólidos, tratamento de efluentes e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL pode ajudar significativamente na viabilização técnica e econômica de projetos para o setor.
Inicialmente, foram buscadas soluções internas, em que o gerador do resíduo procurava dar destinação interna por meio de construção de depósitos ou aterros de resíduos. Em um segundo momento, buscou-se também minimizar a geração dos resíduos por meio de análise do processo produtivo e aumento de sua eficiência no uso das matérias-primas e reuso dos resíduos. Finalmente, os resíduos ganharam status de co-produtos, que, quando bem manejados e desenvolvidos, ainda atendem a demanda de outros processos ou empresas como sendo insumos desses.
O tratamento de efluentes vem evoluindo e ganhando contribuições tecnológicas importantes, uma vez que as restrições legais para o seu lançamento são cada vez maiores. Grande foco na reutilização desses efluentes tem sido dada, tanto para evitar o lançamento no meio ambiente, como para diminuir custos das empresas com captação de água ou mesmo para contribuir para a segurança industrial, uma vez que diminui a dependência da empresa no que se refere à água que, cada vez mais, torna-se mais escassa e cara para as empresas.
Apesar de todo esse avanço, o foco ambiental não era voltado para os potenciais impactos dos gases de efeito estufa (GEE) das mudanças climáticas.
Existe um potencial de emissão de GEE para o tratamento anaeróbico de efluentes com alta carga orgânica, causado pela geração de metano (CH4) e mesmo pela destinação final do lodo orgânico gerado. No caso de resíduos sólidos com alta carga orgânica, a sua destinação pode gerar formação de GEE (CH4) por sua estocagem final, o que é o caso dos aterros sanitários ou dos resíduos de biomassa de empresas destinados a aterros próprios ou de terceiros.
Com a ratificação do Protocolo de Quioto e a criação do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que visam diminuir a geração de GEE, um maior incentivo foi possível para buscar soluções adequadas para aterros e efluentes. Na medida em que a redução de emissões pode ser transforma da em projetos de MDL, passou a haver um maior incentivo para a busca de soluções alternativas na gestão de resíduos e efluentes.
A transformação de emissões de GEE em projetos de MDL, por meio da redução dessas emissões, é possível a partir do atendimento das regras estabelecidas no Artigo 12 do Protocolo de Quioto, e em documentos correlatos, conforme o capítulo 2 desse trabalho. A Tabela abaixo apresenta algumas sugestões e possibilidades de projetos relacionados a resíduos sólidos ou líquidos. Outras oportunidades podem existir, mas a tabela serve como um bom guia para identificação de oportunidades.

Uma vez identificada a possibilidade de projeto, a atividade selecionada deve ser enquadrada em um dos escopos setoriais existentes, conforme as regras estabelecidas. Esses escopos podem ser consultados no site da Convenção-Quadro das Nações Unidade para Mudanças Climáticas (UNFCCC).
Antes de iniciar um projeto, é importante avaliar sua titularidade. Em um sentido geral, a titularidade de um projeto é definida a partir de quem tem o poder de tomada de decisão sobre o investimento ou atividade de projeto que resultará na redução de emissões de GEE.
A partir do conhecimento da titularidade do projeto e da estruturação contratual que viabiliza o investimento, são definidos os participantes do projeto. O próximo passo é a elaboração do documento de concepção de projeto (Project Design Document-PDD), documento base para aprovação de projeto de MDL.
Como parte da etapa da construção do PDD, é importante a identificação de metodologia compatível com a atividade de projeto proposta. Caso não exista uma metodologia aprovada, pode ser conduzida a submissão de uma nova metodologia.
Após seguir todas as etapas formais de projeto até o seu registro no Conselho Executivo do MDL (Executive Board-EB), o projeto é implementado e monitorado, possibilitando a geração das Emissões Reduzidas Certificadas (CER).
Um forte impulsionador desses projetos são os mercados existentes para comercialização das CER. O mercado de emissões de GEE reduzidas vem crescendo significativamente de ano para ano, conforme dados do Banco Mundial. Em seu relatório de 2007, o banco identifica um crescimento de aproximadamente 30% nas transações de redução de emissões em geral de 2005 para 2006 (passando de 378 milhões de toneladas de CO2 em 2005 para 493 milhões de toneladas de CO2 em 2006). No mesmo relatório é apresentado um detalhamento das transações realizadas por classe de projeto.
Esse detalhamento leva em conta os volumes transacionados e posicionam como principais projetos geradores de emissões reduzidas de GEE transacionadas os projetos de HFC23, N2O e eficiência energética/substituição de combustível. Os projetos relacionados a resíduos e efluentes líquidos aparecem com: gás de aterro com 5%, biomassa 3% e resíduo animal 2%. Os dados são apresentados no gráfico a seguir.

Exemplos de metodologias atualmente aprovadas:
- Resíduos (aterros)
- Reaproveitamento de resíduos (cimento)
- Reaproveitamento de resíduos (insumo para cimento)
- Cogeração de energia com resíduos de biomassa
- Sistemas de tratamento de dejetos de animais
- Emissão de metano em tratamento de efluentes orgânicos
- Tratamento de efluentes anaeróbicos em lagoas existentes
- Emissão evitada em resíduos orgânicos por tratamento alternativo de efluentes
- Substituição de combustível fóssil por resíduos de biomassa em caldeiras para geração de calor
- Redução de emissão de metano em efluentes orgânicos e lixo sólido orgânicos usando compostagem
- Produção de biodiesel a partir de óleo de cozinha
- Aumento de eficiência de caldeira pelo uso de emulsão de resíduos de água e óleo
- Emissão de metano evitada de resíduos de biomassa com seu uso como insumo na produção de papel e celulose
Fonte: Manual de Capacitação sobre Mudança do Clima e Projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) – Centro de Gestão e Estudos Estratégicos – Brasília, DF: 2008